No início dos anos 2000, a internet dava passos lentos, especialmente no Brasil. De acordo com o Mapa da Exclusão Digital da Fundação Getúlio Vargas, em 2001 apenas 12,46% dos brasileiros tinham computador em casa e apenas 8,31% estavam conectados à rede. O cenário era dominado por sites pensados para desktop, sem qualquer preocupação com versões móveis, já que os smartphones ainda não faziam parte da realidade.
Com as versões de HTML limitadas para recursos multimídia, animações eram feitas basicamente com gifs ou com o software Flash, da Macromedia. O Flash, lançado em 1996, era o programa usado para criar animações, jogos e aplicações interativas. Para que o público pudesse acessar esse conteúdo, existia o Flash Player, um plugin distribuído gratuitamente e instalado nos navegadores. Popularmente, os dois acabaram sendo chamados apenas de “Flash”.
A tecnologia rapidamente se tornou um padrão para experiências mais complexas na web. E foi em 2005 que a Adobe adquiriu a Macromedia por cerca de 3,4 bilhões de dólares em ações, incorporando o Flash, o Flash Player e outros programas como Dreamweaver e Fireworks ao seu portfólio.
Durante anos, o Flash foi sinônimo de inovação digital. Sites muito famosos no Brasil, como Humortadela, Izolita e Charges, exploravam suas possibilidades, enquanto plataformas internacionais como o YouTube em seus primeiros anos e o portal Newgrounds, referência mundial em animações e jogos independentes, utilizavam o Flash para exibir seus conteúdos. O software também era amplamente usado em banners publicitários e até em interfaces inteiras de websites, que se tornavam interativos e animados.

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Mas os problemas em relação a essa tecnologia também eram comuns. O Flash era alvo constante de críticas por falhas de segurança, travamentos e alto consumo de recursos. Com o crescimento da internet móvel no fim da década de 2000, ficou evidente que a tecnologia não se adaptava bem a smartphones e tablets.
Foi nesse contexto que Steve Jobs, então CEO da Apple, publicou em 29 de abril de 2010 a carta aberta “Thoughts on Flash“ (Reflexões sobre o Flash). No texto, Jobs listava razões para não permitir o uso da tecnologia no iPhone, iPad e iPod Touch. Entre os pontos estavam instabilidade, falhas de segurança, consumo elevado de energia e a ausência de suporte adequado ao toque, algo central nos dispositivos móveis. Ele também dizia que o Flash funcionava como um intermediário entre quem criava e o sistema da Apple, o que na visão dele dificultava o desenvolvimento de aplicativos mais estáveis e eficientes. A repercussão foi imediata e acentuou o debate sobre o futuro da tecnologia.
A Adobe reagiu publicamente. O então CEO Shantanu Narayen classificou a carta como um ‘ataque extraordinário’ e disse que muitos problemas descritos eram responsabilidade do sistema operacional da Apple, não do Flash. Ainda assim, o mercado já se movia em outra direção. O avanço do HTML5, que passou a oferecer nativamente suporte a áudio, vídeo e gráficos, enfraqueceu a necessidade do Flash Player. Navegadores como Chrome, Firefox e Safari começaram a reduzir seu suporte gradualmente, enquanto grandes plataformas migraram para soluções abertas.
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Até que em julho de 2017, a própria Adobe anunciou que encerraria o suporte ao Flash em 31 de dezembro de 2020. O bloqueio definitivo da execução de conteúdo ocorreu em janeiro de 2021.
Embora Steve Jobs não tenha sido o único responsável pelo fim do Flash, sua carta teve papel decisivo ao acelerar a discussão e influenciar a indústria. O software de criação que deu origem ao Flash continuou com o nome Adobe Animate, migrando seu foco para HTML5 e conteúdos compatíveis com os padrões modernos da web.
Hoje, a tecnologia é lembrada como um marco da web dos anos 2000, mas também como exemplo de como padrões abertos e compatíveis com dispositivos móveis se tornaram essenciais na evolução da internet.