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“Criar é preciso!” – Entrevista com a artista baiana Juliana Pina

Natural de Salvador, Bahia, a artista Juliana Pina encontrou na arte a sua missão e vem fazendo disso uma busca continua por evolução. Desde criança, sentiu afinidade com os processos criativos e buscou ao longo da vida, aprimorar o seu talento e sua técnica.

Atualmente, Juliana conta com milhares de seguidores nas redes sociais, que acompanham seu trabalho e encontram nela uma motivação para evoluir também. Seja na colagem, ilustração ou na pintura, suas ideias são transmitidas como um tiro certeiro ao espectador, em uma explosão de cores, formas e ideias.

A artista baiana conversou com o INSPI e contou um pouco mais sobre sua trajetória, projetos e visão, trazendo ideias consistentes sobre arte para todos aqueles que gostam de conhecer e absorver. Confira essa entrevista exclusiva com Juliana Pina:

Foto: Juliana Pina

INSPI: Há quanto tempo você trabalha com arte e como foi o seu caminho desde então?

Juliana Pina: A arte esteve presente desde criança, nas aulas de teatro, de dança, nas revistinhas de colorir, nos livros que eu era fascinada e nos presentes que eu sempre pedia: lápis de cor! Crescer rodeada de discos de vinil enquanto meu pai se encontrava na carreira de DJ foi um estímulo e tanto! Aos 15 anos, comecei a levar esse interesse pelas artes mais a sério. Os desenhos que eu fazia nos cadernos da escola começaram a ser mais constantes do que as anotações.

Comecei a postar algumas coisas e a vender algumas caricaturas para colegas (dinheiro suficiente para lanchar durante a semana). Minha página no Facebook começou a ter um ótimo alcance e muita gente acompanhava. No começo, eu queria experimentar de tudo. Fiz muita coisa de artesanato e adorava presentear os amigos com desenhos. Participei de algumas feiras e eventos. Tive até um quadrinho publicado numa fanzine nacional feita por mulheres, chamada “Zine XXX”, tive uma entrevista especial para o Tumblr, como blog destaque e tive alguns trabalhos compartilhados por famosos (o que a internet não faz, não é mesmo? rs).

Aos 17, prestes a terminar o ensino médio, decidi tentar dois cursos no vestibular: Publicidade e Propaganda em uma universidade particular e Bacharelado Interdisciplinar em Artes em uma universidade federal. Cursei os dois ao mesmo tempo durante um semestre; tempo suficiente pra entender que eu jamais conseguiria fugir da minha missão (que no fundo, no fundo, eu sempre soube qual era). A partir daí foi um caminho lindo de descobertas e aprendizados! Me formei em 2018 como Artista Interdisciplinar, pela UFBA, e hoje estou me graduando em Empreendedorismo, pela Escola Cafeína. Consegui montar meu ateliê em casa, onde crio com mais tranquilidade e consigo manter a qualidade de vida que desejo, num ritmo mais slow e respeitando meus processos.

INSPI: Quais meios e processos você costuma explorar em suas criações?

Juliana Pina: Atualmente, meu trabalho se desenvolve a partir das colagens e das ilustrações. Essas são as duas linguagens de onde nascem as pinturas que faço em paredes. Demorei um pouco pra perceber que esses três eixos estão intimamente conectados, porque fazia muitas outras coisas ao mesmo tempo. Limitei a minha cartela de serviços e pude abraçar melhor esse processo criativo que parte, principalmente, da colagem. Hoje entendo meu trabalho como um organismo vivo que vai se transformando e criando seus caminhos dentro das infinitas possibilidades da criatividade.

Créditos: Juliana Pina

INSPI: Atualmente você vive exclusivamente da sua arte? Quais são os maiores desafios para a carreira de um artista?

Juliana Pina: Desde que decidi trabalhar com arte, sempre foi muito difícil trabalhar com outras coisas. Tive algumas curtas experiências em outros lugares, assumindo funções que não tinham muito a ver comigo. Encarar o meu trabalho artístico como única fonte de renda sempre foi o meu maior desejo. Hoje tenho o privilégio de poder abraçar minha profissão em 100% do tempo, trabalhando em casa e contando com o apoio de familiares quando preciso. 

Acredito que muita gente tem a ideia de que ser artista deve ser fácil e delicioso, “ficar pintando o dia inteiro”. Mas, basicamente, quando se trabalha sozinho num sonho tão particular, você assume funções que não fazia ideia de que eram necessárias! Acredito que o maior desafio seja conciliar todas essas funções e ainda assim conseguir manter um ritmo para criar. Hoje lido sozinha com demandas que qualquer empreendedor lida: vendas, estratégias, marketing, atendimento, finanças, entregas, redes sociais… é basicamente gerir uma empresa de uma pessoa só (e ainda assim, encontrar tempo para criar)! Quando escolhi trabalhar com o que mais amo fazer, não imaginava que teria que fazer tantas coisas (muitas das quais nem gosto), mas aprendi a ver essas etapas como parte do meu processo criativo.  

INSPI: Como você costuma trabalhar a divulgação e a venda da sua arte?

Juliana Pina: Eu entendo que redes sociais são ferramentas poderosas e faço o possível para que elas trabalhem a meu favor (e não o contrário, rsrs). Meu instagram hoje é uma grande vitrine do meu portfólio – vejo o quão é importante mantê-lo vivo, por se tratar de produtos e serviços que são super visuais. Também mantenho um site, que é um espaço onde organizo melhor tudo que produzo, consigo manter contato por email com assinantes e criar um conteúdo exclusivo. Geralmente, a maior parte dos clientes chega pelo instagram ou por indicações. Trocamos algumas ideias, eu procuro entender o que cada cliente precisa, gosto de criar conexões sinceras e bacanas. Cada trabalho é único, pensado exclusivamente para cada pessoa ou lugar.     

Créditos: Juliana Pina

INSPI: Como você define a temática da sua arte?

Juliana Pina: Meu trabalho se desenvolve a partir de temáticas com as quais eu me identifico. Nesse aspecto, acredito que é muito difícil a arte não falar também sobre quem a produz. Sinto que estou o tempo todo me transpondo para as coisas que faço. Então, falo sobre natureza, feminismo, política, criatividade e outras reflexões que sinto que são necessárias e que estão sempre borbulhando na minha cabeça. Me sinto leve com essa característica que a arte geralmente tem, de quase sempre transmitir o que o artista é ou tem interesse; assim fica mais sincero e promove conexões mais legais.  

INSPI: Qual é o projeto ou trabalho que você mais se orgulha de ter feito?

Juliana Pina: O Laboratório Criativo de Colagem! É um curso presencial montado com muito carinho e que trouxe ainda mais sentido pro meu trabalho. Compartilhar conhecimento para além das telas é muito gratificante. Proporcionar experiências criativas, divertidas e que estimulem novos olhares para a arte e para a criatividade é o que mais me motiva. Sinto muito prazer quando troco com os alunos. Volto pra casa sentindo que fui aprender mais do que ensinar.

Foto: Juliana Pina/Reprodução

Também me orgulho muito de algumas paredes que pintei. Cada uma é um enorme papel em branco, onde sei que vai nascer uma transformação! É delicioso todo o processo.

Foto: Juliana Pina/Reprodução

INSPI: Qual foi a melhor experiência que a arte já te proporcionou?

Juliana Pina: Difícil escolher só uma! Mas sinto que a melhor experiência é talvez a mais sutil. Receber mensagens de pessoas dizendo como meu trabalho inspirou elas a voltarem a criar, ou como fez diferença ler algo que escrevi, ou como uma pintura que fiz numa parede transformou o ambiente e o astral das pessoas que vivem ali… uma vez recebi uma mensagem de uma moça dizendo que ao passear pelo feed do meu Instagram, ela conseguiu escapar de uma crise de pânico. Essas pequenas revoluções cotidianas são as melhores experiências que eu poderia causar e viver junto. 

INSPI: Quais artistas te inspiram a ser artista também?

Juliana Pina: Nossa, são tantos! Tenho muitas referências que admiro e não saberia escolher apenas uma. Muitas dessas referências nem são artistas, mas me inspiram a continuar desenvolvendo o trabalho que faço. Admiro muito o trabalho de artistas locais que se tornaram colegas e amigas, como Miu Monteiro, Olívia Ribeiro e Juh Almeida. Alguns artistas nacionais como Catarina Bessel, Adriano Catenzaro e a dupla Lanó. Adoro acompanhar as mentes criativas de Rafa Cappai, Sue Coutinho e o pessoal da Transcriativa. Me sinto tentada a escrever os nomes de todas as pessoas que admiro e me inspiram, mas a entrevista ganharia mais duas páginas! rsrs 

INSPI: Para você, arte é um ato político?

Juliana Pina: Se não fosse, não seríamos tão censurados ao longo dos séculos, nossas instituições não teriam tanto medo de incentivar o olhar artístico, nossos adultos não seriam tão resistentes com a ideia de que a criatividade é revolucionária. Acredito que a arte é uma poderosa arma para construir pensamentos, desconstruir certezas e “verdades absolutas”, educar e ampliar a consciência. Política é sobre tudo isso. Está no combo, não tem como escapar! Produção artística é posicionamento. Como sempre digo: criar é preciso!  

INSPI: Como você vê a representatividade das mulheres na arte atualmente?

Juliana Pina: Me orgulho de ver e fazer parte de uma cena sendo ocupada com tantas mulheres talentosas, mas acredito que enquanto mulheres artistas de quaisquer áreas e linguagens ainda precisarem responder sobre representatividade feminina nessas áreas de atuação, é sinal de que ainda não ocupamos o suficiente. Assim como saber que boa parte das mulheres que estão nos museus e galerias não estão na posição de artistas, mas sim pintadas nuas nas telas. Ou perceber como a maioria masculina ainda predomina e se beneficia em festivais de arte urbana. Para nós, há muito tempo tem sido um caminho com mais obstáculos do que para os homens, mas não deixaremos de caminhar e chegar ao topo.

Créditos: Juliana Pina

INSPI: Que importância você dá para a arte na formação do indivíduo e da sociedade como um todo?

Juliana Pina: Hoje, como educadora (não estava nos meus planos me tornar uma, mas aconteceu – e é apaixonante), fica ainda mais explícita a importância da arte na formação do indivíduo e da sociedade como um todo. Me sinto honrada por poder ter sido estimulada na infância, ter feito escolhas que me possibilitaram caminhar pelas artes e não permitir que minha criatividade fosse podada, como o que o sistema de educação padrão deseja.

Hoje, olhando de fora, percebo como existem falhas gigantes na forma como a arte é tratada na escola e como isso impacta profundamente no ser humano. A maioria das pessoas que se tornam minhas alunas vêm buscar algo que elas “perderam” em algum lugar entre a infância e a adolescência. É comum ouvir frases como “eu amava fazer isso, mas de repente eu parei e nunca mais fiz porque comecei a achar que não era boa”. Nesses relatos, eu encontro os pontos das histórias pessoais onde a criatividade foi empurrada por um monte de cobranças, crenças e expectativas da vida adulta. Boa parte disso é consequência de um sistema de educação que já não estimula, não provoca, não desperta. Apenas insere mais informação para ser armazenada, muitas vezes sem propósito, e ser despejada em algumas várias questões de provas que serão avaliadas numericamente, onde a disputa entre certo vs errado prevalece.

Ignorar as multipotencialidades dentro das multipersonalidades que existem numa sala de aula para educar a todos de um jeito que é considerado o jeito certo é um erro gravíssimo. Estamos repetindo isso há séculos. A arte faz parte de um estímulo para além do olhar estético. Ela amplifica o olhar para o mundo, lembrando das nuances existentes entre as pessoas, a natureza, a mente humana. Ela potencializa habilidades não só manuais, mas relacionais, sensíveis, estratégicas, filosóficas. Ela atinge espaços dentro de nós que nenhuma outra ciência atinge.

A criatividade, que deveria ser um fluxo bonito que perpassa por todos os eixos da educação e prevalece durante toda a vida, constantemente, fica presa em algum canto escuro das cadeiras enfileiradas. Arte, criatividade, curiosidade e educação são 4 parceiras que quando caminham juntas, criam seres humanos extraordinários!        

INSPI: Obrigado pela entrevista e para finalizar, cite uma música, um livro e um filme que você goste muito.

Juliana Pina: Eu estava temendo por essa parte! Mas vamos lá… rsrs

Música: Deus me proteja de mim, do incrível Chico César
Livro: A arte da criatividade, do excelente Rod Judkins 
Filme: DivertidaMente, animação de ouro da Pixar 

Acompanhe o trabalho de Juliana Pina:
Site: www.julianapina.com
Instagram: www.instagram.com/juliana_pina